Todo
jogador de futebol é apaixonado pela bola e por uma boa pelada ou “baba”, como
chamam na Bahia. Pelo menos aqui no Brasil. Mesmo quando estão de férias,
poucos resistem a um convite para um encontro com os amigos, jogar uma bolinha
e depois comer um churrasco. Algumas, então, não há como rejeitar. Foi o que
aconteceu quando, certa vez, lá pelos longínquos anos oitenta, Raimundo Fagner
resolveu fazer uma festa em Fortaleza para festejar a conquista de alguns
discos de ouro que ele fizera por merecer. O evento deveria se realizar no
Castelão – o maior estádio do Ceará – onde participaríamos de uma partida de
futebol e ele receberia os seus prêmios. Raimundo convidou muitos amigos do
meio artístico e do futebol. Estavam nessa Zico, Roberto Dinamite, Cláudio
Adão, Reinaldo, Eder, Zé Ramalho, Fausto Nilo, Gonzaguinha e tantos outros que
não me lembro mais.
O
aquecimento para o jogo se deu na casa de Zé Ramalho e Amelinha – que nessa
época estavam juntos. Eles moravam em uma linda residência no alto da Praia do
Futuro com uma linda vista para o mar. Haviam preparado uma bela feijoada para
receber todos os que iriam participar da festa. Lá pelas onze da manhã, o
pessoal começou a chegar. Fomos recebidos com imensos sorrisos e muito carinho
pelos anfitriões acompanhados por uma caipirinha ou um copo de cerveja bem
gelada. Quando cheguei, o Fagner já estava por lá pilotando uma vitrola (que
tempo bom!) com a fita de demonstração do seu mais novo disco, que deveria sair
no início do ano seguinte. O homem parecia apaixonado pela nova música, pois
ele não deixava ninguém dedilhar um violão e muito menos mudar o disco que
tocava. Sem exagero, acho que nós tivemos que ouvir a mesma canção por umas
três horas. Ainda bem que ela era muito bonita, se não uma pequena rebelião
teria se instalado na mansão dos Ramalho.
O
jogo de futebol estava marcado para se iniciar às quatro horas da tarde, mas já
era quase isso e o almoço ainda não havia sido servido. Parecia que ninguém se
lembrava da razão da nossa estada ali – também pudera, com a animação em que
todos estavam eu já duvidava que a partida fosse acontecer.
Mas
felizmente alguém com o que restou de consciência conseguiu carregar aquele
povo todo para o estádio onde nos aguardavam cerca de 15 mil pessoas que
tiveram a coragem de ir até ali acompanhar aquele jogo de final de ano. E o
público, mesmo com todo o nosso atraso, estava tão eufórico que parecia que
havia saído de uma noitada mais alegre que a nossa. Como nos vestiários o clima
também continuava de festa, resolvi farrear de vez. Coloquei a camisa pelo
avesso, um chapéu panamá na cabeça, entrei em campo junto da equipe adversária
e, vejam só, calçado apenas com uma sandália dessas de tira. E fiquei assim o
tempo todo. O jogo foi fantástico e algumas particularidades merecem ser
citadas como, por exemplo, a verdadeira caçada de Eder ao goleiro adversário –
um amigo cearense cujo apelido é Gordinho. Como o Gordinho usava brincos nas
orelhas – algo raro naquele tempo – o maluco do Eder resolveu atazanar a vida
dele e avisou que todo chute seu teria invariavelmente o objetivo de acertar um
dos brincos. E foi o que fez com a colaboração da defesa adversária que a cada
ameaça de chute por parte do Eder se retirava da frente só para ver o que
aconteceria. Não foram poucas as vezes em que a bola explodiu no corpo do
gordinho. O bicho saiu até tonto de tanta pancada.
Eu,
do meu lado, joguei praticamente toda a partida de calcanhar. A cada toque que
eu dava na bola a galera ia à loucura. Parecia uma catarse coletiva. Quando
olhava para as arquibancadas, o que via era só alegria. Como foi gostoso poder
proporcionar aqueles momentos de alegria para os que lá estavam. Ia fazendo
aquela festa com o povão, quando o juiz – dos piores, com certeza – resolveu
marcar um pênalti para o nosso time. Corri para a bola, agarrei-a e coloquei-a
debaixo do braço. Aquela penalidade tinha que ser batida por mim. Coloquei a
bola na marca de cal, esperei que todos saíssem da área e me posicionei para
bater de costas; de calcanhar. Vocês não imaginam o furor com que o público
reagiu àquele gesto – foi uma loucura. Demorei o máximo que pude enquanto a
manifestação exterior aumentava cada vez mais e finalmente disparei o tiro. A
bola saiu dos meus pés com tanta força que até me assustei e... explodiu contra
a trave esquerda do Gordinho. Gente, que maravilha; nunca um pênalti perdido
foi tão aplaudido. Só me restava gargalhar de felicidade.
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